quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Leve um casaco, pode esfriar!



Quando era criança, eu detestava quando meus pais dormiam a tarde inteira de sábado ou domingo. Pra quê dormir tanto assim? pensava. Por que não ir passear, fazer alguma coisa interessante? Hoje eu faço exatamente a mesma coisa.


Eu achava que minha mãe ficava muito estressada quando iríamos receber visita de parentes em casa. Ela não parava de arrumar a casa e cada coisa que bagunçávamos era motivo pra bronca. A casa tinha que ficar nos trinques e o cardápio das refeições tinha que ser maravilhoso.


Hoje eu faço exatamente igual. E quase morro pra deixar o lavabo arrumado, cheiroso e habitável, com toalha bonitinha pras visitas. E olha que é uma tarefa bem difícil quando você tem três homens em casa que ainda mijam pra fora e o filho mais novo ainda não aprendeu a dar descarga. Desinfetante de meia em meia hora é a solução. 


Outra coisa que eu ficava P da vida: Como eles podiam errar meu nome? Viviam confundindo meu nome com os meus irmãos. Hoje eu confundo o nome dos meus filhos até com o nome do meu cachorro. 


Quando minha mãe encontrava algum conhecido na rua eu me cansava de esperar e não entendia pra quê tanta conversa e bate papo. “E sua mãe, fulana? Melhorou?” e aí a conversa não acabava mais. E eu em pé lá, esperando e pedindo: “Mãe, chega, vamos embora?”. E hoje? Tudo igualzinho... eu paro pra conversar e meus filhos também reclamam.


Também não entendia por que meus pais não tinham respostas pra todas as minhas perguntas. Se me ensinaram que eu não podia mentir, por que deveria abrir um presente de aniversário decepcionante e dizer, sorrindo, que eu amei aquilo?


Por que eles trabalhavam tanto e por que tinha que tomar banho todo santo dia? Nem suei hoje, eu pensava. E por que precisava comer salada, se nem gostava tanto assim? 


Pra quê passar batom, mãe? Só vamos ali na padaria. E hoje não saio de casa sem batom, protetor, corretivo, base e blush.


Não entendia por que tinha que ouvir a viagem inteira as músicas que meu pai queria e hoje falo pros meus meninos: O carro é meu e ouço o que eu quiser. Quando vocês tiverem seu carro, vocês podem escolher a música que for.


Achava o cúmulo ter que me levantar da mesa do almoço umas 10 vezes pra pegar as coisas que meu pai queria e não estavam na mesa. Primeiro era o guardanapo, depois era o limão, depois era a pimenta. Depois ele via que o suco estava sem gelo e pedia umas pedrinhas pra mim. Aí ele via que o suco estava sem açúcar, e lá vai eu. Essa faca não está cortando filha, pega outra pra mim? Ih...tá faltando o queijo ralado. Pega aí filha, você está mais perto da geladeira. ( Pai,nem tente se defender pois eu tenho testemunhas) Hoje? Tento maneirar, pois sei como era duro, mas sobrevivi e sei que meus filhos também vão. 


Minha mãe ficava horas tirando cutícula na cama. Achava um exagero aquilo. Que tanto ela tirava naqueles dedos, meu Deus? Hoje descobri que isso é uma delícia. Nem vejo o tempo passar.

E foi então que percebi que a Elis Regina tem razão. Se você tem mais de 30 anos talvez conheça aquela música: “Como nossos pais”. Se tem menos de trinta, procura aí no Google. Digite as palavras “letra música Elis Regina como nossos pais” e você vai ver que um trecho da música é assim:

“ ...mas nós somos os mesmos e vivemos como nossos pais”. O compositor da música foi o Belchior, aquele que endoidou uns tempos atrás. Mas a música bombou e viralizou nas redes sociais da época na potente voz de Elis Regina mesmo. O contexto da letra da música era totalmente diferente do meu texto aqui, mas roubei. Dá licença, tá?


Agora vejamos, se teu pai foi um alcoólatra e te espancava todo dia, não seja como ele. Mas você aprendeu o que NÃO se deve fazer. Então pegue o que foi bom e tente jogar fora as coisas ruins. Ele te ajudava a fazer a tarefa, era educado e cumprimentava todas as pessoas? Aí! Pegue isso como exemplo pra você. Dá um Ctrl C e Ctrl V no que foi legal e um Delete no que foi desastroso. As estatísticas dizem que se seu pai foi alcoólatra você tem chance de ser também. Mas Deus é muito maior que as estatísticas, convenhamos. Mande a estatística pra aquele lugar. Você pode lapidar esse DNA que recebeu e passar um bem melhor pros seus filhos. Minha funcionária aqui de casa, por exemplo, teve os pais alcoólatras. Ela não suporta cheiro de bebida. Nem passa perto. Quando eu faço risoto ela se nega a comer, pois diz que sente o gosto do vinho.  Sagu com vinho também nem experimenta. Eu entendo. Melhor assim.
 Escolha o exemplo que você quer seguir, pegue o que seus pais te ensinaram de bom e jogue fora o que foi ruim. Não esqueça que eles não eram perfeitos e que você também não é.

Agradeço a Deus a educação que meus pais me deram. E se eu conseguir ser um pouco que eles foram pra mim e meus irmãos eu já fico feliz. E isso você percebe bem melhor quando tem os seus filhos. Aí você dá muito mais valor. Hoje meus filhos reclamam muito de mim. Sei que demora pra eles perceberem que é pro bem deles que falamos tantas vezes a palavra “não”. Mas vai chegar o dia que eles vão perceber.


Só sei de uma coisa, quando tiver seus filhos você mesmo irá levar um susto quando ouvir as palavras saindo da sua boca:

“ Filho, vai sair? Leve um casaco, vai esfriar.”



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